Alex Pereira Barbosa, ou MV Bill, é filho de Mano Juca, bombeiro hidráulico, e de Dona Cristina, dona-de-casa. Nasce em 3 de janeiro de 1974 no conjunto habitacional Cidade de Deus, situado na Zona Oeste do Rio de Janeiro, onde mora até hoje. Bill é um apelido de infância, referência a ”Rato Bill” – desenho de um rato que vinha em figurinhas de chiclete durante a Copa do mundo de 82. O apelido MV aparece por volta de 1991, quando escuta Public Enemy - grupo de Nova Iorque muito politizado – e lê as biografias de Malcolm X e de Zumbi dos Palmares. A partir daí, passa a conscientizar os moradores de sua comunidade, através de conversas e do rap. Algumas senhoras evangélicas da Cidade de Deus, ao verem como o cantor transmitia a mensagem popular das favelas e suas críticas aos problemas sociais, batizaram-no como Mensageiro da Verdade.
Conhece o rap em 1984, época em que a onda do break e do Miami Bass – derivação do rap feito em Miami – chega ao Rio. Mas sua relação com o movimento hip hop começa em 1988, ao assistir ao filme Collors (As Cores da Violência, de Dennis Hopper), sobre guerras de gangues em Los Angeles, considerado uma das principais denúncias cinematográficas feitas ao preconceito contra os negros nos Estados Unidos. Depois de ler traduções de duas canções da trilha – de nomes como Ice-T e Big Daddy Kane – Alex, que começou a fazer música cantando e compondo sambas com seu pai, a partir de então passa a ter o hip hop como movimento de militância. Em 1993, participa da coletânea “Tiro Inicial”, que revelou talentos do rap nacional como Gabriel o Pensador. Em 1998, lança o disco CDD Mandando Fechado (Zâmbia Fonográfica), cujas músicas são baseadas em fatos reais ocorridos em sua comunidade (Bill modificou os nomes para preservar a identidade das pessoas). Um ano depois o álbum é remasterizado, acrescido de três faixas e relançado com o título Traficando Informação (Natasha Records). Com produção de Ice Blue, que participa junto com KL Jay (ambos dos Racionais), DJ Will, DJ TR, PMC, Marden Jam, K-mila, Coral Gospel Brothers e Neo Boy, o disco apresenta 13 faixas, entre as inéditas, De Homem pra Homem, Soldado do Morro e Sem Esquecer as Favelas. No mesmo ano, exibe seu primeiro videoclipe, Traficando Informação, produzido pela Conspiração Filmes. Sua participação no Free Jazz Festival, no show de abertura do grupo de Nova York The Roots, marca seu nome definitivamente no cenário nacional.
Em dezembro de 2000, lança o videoclipe Soldado do Morro, que mais do que um videoclipe, é um documentário sobre o trabalho infantil a serviço de traficantes, retratando de forma crua o cotidiano destes menores em 14 favelas, 10 delas no Rio de Janeiro. Recebe uma série de represálias e acusações de apologia ao crime, mas também o apoio de personalidades da música e adeptos do movimento que conhecem seu trabalho social. O clipe, dirigido por Celso Athaíde e Roberto de Oliveira, é premiado pela MTV em 2001 e na segunda edição do Prêmio Hutúz de Hip Hop – considerado o maior prêmio do gênero na América Latina –, sendo exibido em favelas do Brasil, ong’s e universidades. MV Bill também ficou com o troféu de destaque do rap nacional no DJ Sound 2001.
Em 2002 é a vez de Declaração de Guerra (Natasha/BMG, 2002). O disco traz o espírito da luta em prol dos excluídos, que faz do cantor uma referência para os jovens, especialmente os negros de favelas cariocas. A verdadeira guerra, declara, é contra a exclusão e o preconceito. O CD tem participações do grupo Charlie Brown Jr., dos rappers Buiú Dadoze, K-mila e Nega Gizza e a de seu pai. Neste trabalho, o cantor ampliou sua estética, incorporando mais elementos da música brasileira. Canções como Marginal Menestrel, que começa em ritmo de samba-rock e tem a participação de seu pai, Dizem que Sou Louco, com samplers de Na Rua, Na Chuva, Na Fazenda, sucesso de 1975 composto pelo baiano Hyldon e Mina de Fé , com samplers de Samurai, de Djavan, são exemplos do que MV Bill define como rap popular brasileiro. Outros destaques são as faixas Só Deus Pode me Julgar, gravada com uma orquestra de 13 músicos sob regência do maestro Nilton Carneiro, e Soldado Morto, que condena a matança de pobres pelos próprios pobres na guerra do tráfico.
Referência comunitária, personagem midiático, MV Bill é o símbolo de um discurso político que faz da crônica musical das guerras nas favelas brasileiras o ponto de partida de uma fala urgente sobre violência, discriminação e cidadania. Canta a realidade brasileira, resgatando a cultura negra e conscientizando a periferia. Junto com o produtor Celso Athaíde, criou a CUFA, Central Única das Favelas, uma organização não-governamental que possui bases de trabalho em várias partes do Brasil e cuja forma de expressão predominante é o hip hop. Visa a promover a produção cultural das favelas brasileiras, através de atividades nos campos da cidadania, educação, esportes e cultura. Nela, jovens produzem videoclipes, documentários, shows, além de participarem de oficinas que trabalham com elementos do gênero.
Em abril de 2005, junto com o produtor Celso Athayde e o ex-secretário de segurança Luiz Eduardo Soares lança Cabeça de Porco, pela editora Objetiva. O livro fala sobre os jovens no mundo do crime. Foram usadas entrevistas e filmagens feitas por Athayde e MV Bill nos últimos 15 anos em favelas de nove estados e pesquisa etnográfica de Luiz Eduardo sobre violência e polícia.
Eles sintetizam no livro as informações sociais e culturais acumuladas por um trabalho iniciado em 1997 e pela observação crítica de crianças e jovens que vivem essa realidade em nove estados brasileiros. “A maior descoberta que a gente teve nessa pesquisa toda é que existe mais de um Brasil e o livro seria uma forma de a gente começar a apresentar um Brasil pro outro. Por mais sofrimentos que a gente tenha passado, sentido e visto, ainda assim é possível no nosso caso botar a cabeça no travesseiro e dormir sem o sentimento de omissão, por mais que a gente saiba que não vai conseguir mudar a realidade, mas saber que a gente está fazendo alguma coisa para mudar, é o que me mantém vivo”, disse Bill durante o debate Violência e Juventude, realizado no auditório do Globo em 11 de abril. Em 2006, esse trabalho encontra eco em imagens e choca o país com o lançamento do projeto-documentário Falcão – Meninos do Tráfico , exibido pelo programa Fantástico, na Rede Globo.
No mesmo ano, MV Bill lança as outras duas partes do projeto: o livro homônimo, sucesso de vendas no país e o disco O Bagulho é Doido, distribuído pela Universal (com previsão de saída em Final de Maio/Junho 2006). Baseado no documentário, a obra serve como uma espécie de trilha sonora do filme. Além da batida forte e seca do hip hop que denuncia a violência, vem com músicas surpreendentes e dançantes, como O PRETO EM MOVIMENTO, onde faz um pot-pourri da canção Olhos Coloridos, cantada por SANDRA DE SÁ e ENQUANTO EU POSSO, com participação de HANNA LIMA.